segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

NOSSAS HISTÓRIAS EM VERSÕES

              Um dos maiores prazeres e peculiaridades da arte narrativa é a liberdade ao se contar uma história lançando mão de nossas próprias referencias. O ser pensante que ouve a história, ao tentar reapresentá-la em uma nova narração agrega e/ou suprime detalhes que dará à sua fala a marca particular de um autor.

              Nesses anos de convivência com o nosso público de maior alcance, as crianças, fomos presenteadas com diversas histórias contadas por elas ao sabor do momento. Muitas vezes logo depois de contarmos, abrimos a roda perguntando quem quer contar uma história pra gente. Resultado natural entre crianças a partir de 3 anos é que queiram contar uma, duas ou mais histórias que quase sempre não conhecem bem o seu fim ou seu começo. Por isso inventam. Como a menina bonita do laço de fita, que não sabia, mas inventou!

              Recentemente, trabalhando nas atividades de férias em um shopping aqui da cidade de Curitiba, escutei uma versão interessante da história da "Tartaruga e a Fruta Amarela" do livro Contos de Bichos do Mato de Ricardo Azevedo. Contei a história sendo constantemente interrompida pela autora desta versão que irei apresentar. Tinha 4 anos, estava fantasiada de onça e queria porque queria que a onça desse um desfecho na história que eu ainda estava contando. Daí, quando finalmente consegui terminar a história, fiz a pergunta retórica: alguém quer contar uma história agora?

Olívia, a onça impaciente levantou a pata e disse subindo ao palco: - Eu!

E contou:

Era uma vez uma cidade que não tinha água pras pessoas beberem.
Aí apareceu um gigante que destruiu a cidade inteira.
E só uma pessoa estava acordada.
O nome dela era Olívia e tinha 4 anos.
Daí ela foi falar com o gigante. Só ela podia falar com o gigante e ele pediu uma fruta pra ela.
Ele disse que queria uma bananinha.
Daí a Olívia deu um pedaço de banana pra ele e ele foi embora cantando:

-Bananinha, bananinha, não quero esquecer seu nome
-Bananinha, bananinha, não quero esquecer seu nome

Depois disso, as outras crianças aplaudiram, eu tive um derramamento de amores e escrevi mais ou menos a versão dela.

Pra quem não conhece a história que a gente conta da CARAMBOLA CARAMBOLA tem uma gravação que foi feita para o programa Caixinha de Condão da Cia Girolê na série Os Bichos nas Ondas do Rádio especial sobre as tartarugas:

https://soundcloud.com/user-315060524/caixinha-de-condao-10-tartaruga

          O que mais me chamou a atenção na versão da Olívia foi a forma como ela manteve os elementos essenciais da estrutura narrativa e simbólica do conto. Manteve o problema da falta de água e passou a história da floresta para a cidade. Trocou os bichos por pessoas, a bruxa pelo gigante, o herói da tartaruga para ela mesma e a carambola pela banana.

         É interessante a forma como ela redefine os personagens e os elementos mantendo a essência da história. Essa é a arte da escuta refletida na arte da narração. E como a gente faz isso o tempo todo!








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