sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

GIROLÊ 2015 - ANO DE INTEGRAÇÃO CULTURAL

    A Cia Girolê teve realizações muito inspiradoras no ano de 2015, além de ter participado pela quarta vez consecutiva da 34ª Semana Literária do Sesc em Paranaguá apresentando Alice Ruiz e Manoel de Barros para o público infantil e ministrando uma oficina inédita de criação literária para o público adolescente, ter ido à capital gaúcha pela terceira vez no VIII Festival de Contadores de História de Porto Alegre com o conto "A terceira margem do rio" de Guimarães Rosa e apresentado no 1º Encontro de Contadores de Histórias Guido Viaro a curiosa história da Princesa e o Piolho, uma de nossas integrantes, Caroline Casagrande, viveu uma troca muito significativa para a área de pesquisa e trabalho do grupo no primeiro semestre através de sua experiencia de intercambio na cidade de Bahia Blanca, na província de Buenos Aires - Argentina.
       Cabe aqui registrar essa passagem como uma forma de valorizar a integração cultural latino americana, reconhecendo e valorizando nossos encontros e contrastes através da arte e da educação.

Empresto a primeira pessoa para narrar como foi que pude aliar a oportunidade de participar de um programa de mobilidade acadêmica pela UFPR, onde estou concluindo licenciatura em Letras, com o trabalho de Contação de Histórias e Rádio para crianças na cidade onde residi.  
                                               
                                                           
                                                                         
    Cheguei à Bahia Blanca em meados de março para começar o ano letivo na Universidad Nacional del Sur, onde cursei durante quatro meses três disciplinas na área da Literatura e da Educação. Tive a sorte de ter como professora de Didactica de la Lengua y la Literatura, a narradora oral Marta Negrín do grupo Hechiceras de Palabras que formou-se pela Escuela de Narración Oral Estudio De La Palabra de Maryta Berenguer, escritora e narradora de destaque na Argentina. Logo fui apresentada à Maryta que convidou-me para narrar um conto no evento de comemoração do Dia Internacional do Livro Infantil na sua Biblioteca Pajarita de Papel. Assim, pude apresentar a Contação de História Niña Bonita, uma versão em espanhol do texto A Menina Bonita do Laço de Fita de Ana Maria Machado com músicas do folclore argentino e de autoria própria criada em 2009 com Luana Godin, uma das fundadoras da Cia Girolê. Em seguida conheci um centro cultural chamado La Panadería que tinha os domingos reservados para programação infantil, lá também pude apresentar o mesmo conto em duas datas.     

  As apresentações marcaram o início dos trabalhos com muito entusiasmo e fortaleceram o contato com a Escola de Narração Oral de Maryta Berenguer, onde pude frequentar algumas aulas na turma das narradoras avançadas conhecendo um pouco mais da cena de "Cuenta Cuentos" na cidade e na província. Porém, foi na divulgação da Niña Bonita que veio a surpresa maior. Quando estive na Radio Nacional Bahia Blanca AM 560, a rádio pública argentina, para divulgar o evento, perguntei ao locutor Marcelo Dunetz se havia na programação da rádio algum programa para crianças. Diante de sua resposta negativa fiz a proposta de um programa semanal com músicas, histórias, charadas, curiosidades e entrevistas para o público infantil inspirado no programa radiofônico Caixinha de Condão, que desenvolvi e apresentei durante 6 meses na Rádio Globo AM 670 em Curitiba no ano de 2009/2010. Depois de uma breve apresentação da ideia para a equipe da rádio, a proposta de trabalho foi aceita pela direção com data para começar no sábado dia 09 de maio! 




   




                                       






Estúdio móvel da Radio Nacional dentro da Feira do Livro em Buenos Aires
 


   O nome do programa Radio Rayuela foi escolhido junto com Marcelo Dunetz e significa em português o jogo da amarelinha. Definimos também os quadros e o esqueleto do roteiro da série de  9 programas que iriam ao ar todos os sábados das 12 às 13 horas até o dia 04 de julho, quando eu já estaria de retorno ao Brasil. A temática dos programas foi Bichos, cada um deles trazia músicas, histórias e curiosidades referentes a um bicho em especial. No entanto, ainda havia alguns dias antes da estréia e tive a alegria de poder ir à capital Buenos Aires para conhecer a 41º Feira Internacional do Livro de Buenos Aires e participar do 20º Encontro Internacional de Narração Oral: "Cuenteros y Cuentacuentos", "20 Vueltas alrededor del cuento".

        A dimensão da Feira é gigantesca, o público visitante é tão vasto e variado que só posso encontrar comparação a um dia de clássico do futebol no Maracanã num domingo de sol. Sim, os argentinos leem, e leem em quantidade e qualidade; não só valorizam a leitura como a naturalizaram como um hábito comum entre eles. 


                                 
   No Encontro Internacional de Narração, dentro da programação da Feira, pude participar de 3 oficinas fantásticas: Construção de uma partitura cênica para contar contos com a chilena Alejandra Hurtado, Canto, logo Conto com a portuguesa Ana Sofía Paiva e Oficina de radio: uma caminho para socializar as vozes com Lidia Argibay e Agustín Tealdo da Escola Narrativa Radial de Buenos Aires. Mais importante que exercitar as técnicas apresentadas por cada um dos proponentes, os encontros foram válidos para conhecer o trabalho destes artistas dentro de uma linguagem própria e marcada pelos traços culturais de seus países de origem. Tive a oportunidade também de narrar o conto Forró no Céu em português para o público adulto presente na roda aberta de contos Cuentos entre mate y mate coordenada por Carmen Bártolo. 

                                           


     Narrar o conto em português para um público de hispano-falantes foi muito especial, muitos conheciam outras versões da história do sapo que queria ir à uma festa no céu e escondeu-se no violão do Urubu, por isso creio que todos compreenderam a narrativa e puderam conhecer muitas palavras e expressões em português. Essa experiencia mostra como é possível e rica a comunicação entre essas duas línguas vizinhas quando há disposição,tempo, interesse e atenção do falante e do ouvinte. Ponto pro Brasil, ponto pra Argentina. 

     De volta para Bahia Blanca, dei inicio ao programa Radio Rayuela na Radio Nacional. Para produzir cada um dos programas realizei uma vasta pesquisa no acervo de livros da sessão infantil da Biblioteca Popular Bernardino Rivadavia e descobri autores argentinos maravilhosos que não posso deixar de citar aqui: Liliana Bodoc, Maria Elena Walsh(compositora também), Laura Devetach, Javier Villafañe, Jorge Lujan, Liliana Cinetto, Elsa Bornemann, Silvia Schujer, Ema Wolf, Gustavo Roldán, entre outros. Na área da música pra criança conheci alguns compositores de destaque como Luis Pescetti, Magdalena Flietas, Mariana Baggio e diversas canções infantis populares recolhidas das crianças e amigos que fiz na cidade. Duas edições do programa contaram com minhas versões em espanhol de contos brasileiros como o Forró no Céu e a Tartaruga e fruta amarela de Ricardo Azevedo. Além dos textos literários e músicas, houve a participação de artistas locais como a banda de rock para crianças Rodi y los Fantabulósikos, as meninas cantoras do Yaga Plush, a narradora oral Marta Negrin, o escritor infanto-juvenil Horacio Alva, a nutricionista Lorena Cortondo e a bióloga e professora Marisa Ruggiero. 

   Como não podia faltar, também fiz questão de inserir nos programas músicas brasileiras para criança de compositores como Helio Ziskind, Paulo Tatit e Sandra Perez, Bia Bedran e Rosi Greca, algumas com tradução espontânea para o espanhol. Para a transmissão e produção das 9 edições do programa contei com o apoio do locutor Marcelo Dunetz e os trabalhos técnicos de Horacio Vitangeli e Carlos Apaolaza e posso dizer que ao final ficou registrado um material fonográfico de muita riqueza que reuniu boas referencias da produção cultural para a criança latino americana e que servirá aos futuros projetos interculturais da Cia Girolê.




                                             

Ouça aqui a segunda, a sétima e a nona edição do programa: 

                                                      https://soundcloud.com/caroline-casagrande/radio-rayuela-2
https://soundcloud.com/user565315642/radio-rayuela-7
https://soundcloud.com/user565315642

E aqui veja um trecho do programa Sapos (quarta edição) apresentando o conto Forró no Céu em espanhol com a participação das crianças Juan, Catalina e Julieta:



      O trabalho na Radio Nacional me trouxe muita satisfação e alegria, principalmente por unir as áreas de conhecimento a que tenho me dedicado desde 2006: Comunicação, Literatura, Contação de História, Música e consequentemente Educação. Porém, senti necessidade do contato efetivo com o público infantil das escolas da cidade e a curiosidade de conhecê-las. Por isso, através de algumas parcerias pude atuar em Escolas Públicas de Bahia Blanca apresentando meu trabalho de Contação de Histórias. O primeiro deles foi na Escola Municipal de Especiais Stela Maris, através da arte-educadora Silvina Durán(estudante da Escola de Narração de Maryta), onde fui muito bem recebida pelos alunos, professores e colaboradores do espaço. Além de narrar a história da Niña Bonita mais uma vez, apresentei canções populares infantis brasileiras.



  
  O segundo trabalho foi em parceria com o grupo Hechiceras de Palabras, o qual minha professora Marta Negrín faz parte e trabalha apresentando contos em diversas instituições de ensino da cidade. Nesta ocasião apresentei-me na Escola Municipal nº 9 junto com outras 3 narradoras, ou contadoras de história, do grupo em um projeto chamado Cuentos de Brujas, que como o próprio nome já diz, apresenta especialmente contos de bruxas, retirados da literatura infantil argentina. Para "enquadrar-me" na proposta, desta vez apresentei pela primeira vez em espanhol o conto A Tartaruga e a fruta amarela de Ricardo Azevedo, em que há uma bruxa que tenta confundir os animais que vão até o céu perguntar o nome da fruta a Deus. A versão La Tortuga y la fruta amarilla foi feita com o apoio e a revisão de Marta Negrín e teve muito sucesso junto às crianças da escola que terminaram a história cantando comigo: carambola, carambola, no me tengo que olvidar/ carambola/carambola así podremos merendar!




    O último trabalho realizado em escola para crianças em Bahia Blanca foi em uma instituição particular chamada Escuela de la Ciudad, também em parceria com as Hechiceras de Palabras. Junto à narradora Maria Izabel Bendaña apresentei a Niña Bonita, não antes de responder uma série de curiosidades das crianças sobre o Brasil: que animais temos aqui, como são as praias, que língua falamos, do que as crianças brincam aqui, entre outras perguntas que me diverti muito respondendo. 





      Outra experiencia significativa aconteceu no evento Celebraciones, de homenagem a Eduardo Galeano, uma parceria da Universidad Nacional del Sur com as Hechiceras de Palabras. Foram convidados alunos do ensino médio público e particular de Bahia Blanca para participarem de atividades de escuta de narrações de textos do Galeano pelas Hechiceras e produção textual com orientação dos alunos de Didática da professora Marta Negrín. Pude participar fazendo um fundo musical com o violão para textos selecionados do Livro dos Abraços do Galeano narrados pelas Hechiceras e ministrando uma oficina literária baseada em textos do mesmo livro junto aos jovens participantes do evento com ênfase na prática oral interpretativa dos mesmos. 




                           

     O trabalho com os jovens alunos não parou por aí, a convite da bióloga, professora e amiga Marisa Ruggiero participei da Jornada Nacional Lectura Escuela Comunidad na Escola de Educação Secundária nº 24, fazendo uma performance poética e musical com textos de Cecília Meireles e Paulo Leminski e canções populares brasileiras. O evento acontece anualmente nas escolas públicas de ensino médio de Bahia Blanca e tem a intenção de promover ações de incentivo à leitura junto aos pais e alunos de cada instituição. Nesta ocasião, os alunos apresentaram um programa de rádio ao vivo com músicas de protesto e leram trechos de textos literários trabalhados naquele final de semestre. Por mais que eu quisesse apresentar meu trabalho em espanhol, fui solicitada para falar e cantar em português pois, segundo os alunos e professores, soava muito doce e eles gostavam do sotaque. Mais uma vez pude experienciar a troca: uma conversa cheia de descobertas em português e espanhol apontando para horizontes culturais além do futebol e do samba!

                       
                      


   Para encerrar com chave de ouro essa experiencia e levar boas recordações deste pedaço da Argentina tão especial compartilhei com o grupo Hechiceras de Palabras uma oficina voltada para a canção dentro da contação de histórias, um formato novo que viemos a desenvolver mais tarde dentro da programação do VIII Festival de Contadores de Histórias de Porto Alegre em outubro de 2015 com Cleo Cavalcantty. Participaram da oficina 7 narradoras do grupo, além de exercícios de criação de pequenas cantigas para contos clássicos da literatura infantil, narrativas dialogadas para cancões populares infantis argentinas e troca de histórias entre todas, fui presenteada com dois livros da escritora argentina Maria Elena Walsh e uma paródia da canção brasileira Borboleta Pequenina de Adoniran Barbosa feita por elas:   

                               Mariposa colorida             /Borboleta colorida
                               vuela muy cerca de mí       /voa muito perto de mim
                               regalame tus colores         /presenteia-me tuas cores
                               que los quiero en mi jardín /que as quero em meu jardim
                                     
                               Y se un día te alejaras       / E se um te distanciares
                               en busca de otro confín     / em busca de outro confim
                               recordá las Hechiceras     / lembre das Hechiceras
                               que volaron junto a ti       / que voaram junto a ti



   Depois de quatro meses na cidade de Bahia Blanca regressei ao Brasil na segunda metade do mês de julho de 2015. Com o coração e a memória cheios de histórias e canções de onde passei fiz uma pequena apresentação na FNAC de Curitiba com alguns contos e músicas em espanhol para o público que costuma ir compartilhar nossas contações de história aos sábados na loja.

Grupo de narradoras orais Hechiceras de Palabras
  Porém, essa viagem não acaba por aqui! Com o trabalho de tradução de alguns textos da literatura argentina para crianças, criação de versões bilíngues de canções autorais e populares e a pesquisa em produção cultural infantil latino-americana, a Cia Girolê pretende desenvolver projetos visando a disseminação da cultura dos povos vizinhos, utilizando nossas diferenças e semelhanças como aliadas na busca por uma integração cultural que nos faça irmãos na arte e na vida!

      


  COLORIN COLOROU ESTE CONTO APENAS COMEÇOU!!!

   










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